quinta-feira, 28 março, 2024

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Gestão “irresponsável” no Brasil preocupa comunidade internacional

Terceiro país do mundo a registrar o maior número de casos de coronavírus nos últimos 14 dias, o Brasil preocupa a comunidade internacional, que passa a avaliar os riscos associados ao aumento de casos no país e o desgoverno sobre como lidar com a crise. Nesta segunda-feira, a OMS realiza sua assembleia mundial da Saúde. Pela primeira vez, o evento ocorre apenas virtualmente. Mas contará com chefes-de-estado e ministros dos 194 países e deve ser um dos eventos mais importantes na agência em décadas.

O evento ainda será um espécie de teste sobre como cada país tem dado uma resposta à pandemia e uma oportunidade para que os governos transmitam uma mensagem de compromisso de lutar contra o vírus. Até sexta-feira, seria Nelson Teich quem acompanharia os debates e faria o discurso em nome do governo de Jair Bolsonaro. Mas com sua saída do Ministério da Saúde, abriu-se uma incerteza sobre quem representaria o Brasil. A OMS chegou a buscar esclarecimentos sobre quem falaria em nome do país, inclusive para estabelecer sua lista com base no protocolo diplomático.

Neste domingo, Brasília indicou que o discurso do país na OMS deve ser realizado por Eduardo Pazuello, militar que ocupa de forma interina o cargo vago de Teich. O general, que afirmou ser “leigo” em questões médicas, tem coordenado a operação de compras de equipamentos e máscaras. Em Genebra, chamou a atenção o fato de o Brasil indicar a participação de um militar, principalmente diante do número elevado de especialistas reconhecidos e nomes de alto gabarito do país na Saúde. A regra, porém, estipula que um país deve ser representado no evento pelo chefe-de-governo ou por um ministro.

Irresponsável, insano ou louco

A incerteza sobre representaria o Brasil numa das cúpulas mais importantes em anos, porém, foi recebida na OMS e por diversos governos nos últimos dias como mais um sinal da incapacidade do governo de Jair Bolsonaro em dar uma resposta à crise. Para fontes diplomáticas estrangeiras ouvidas pela coluna, o Executivo no país está sendo “inconsequente” e “irresponsável”. Outros são mais duros, chamando o governo de “insano” ou “louco”.

Poucos conseguiam listar um governo pelo mundo que tenha trocado duas vezes de Ministro da Saúde em plena pandemia.

A mudança de ministro pela segunda vez no país coincide ainda com a constatação de que o Brasil superou Itália e Espanha em número de casos, aprofundando as desconfianças internacionais de que não existe um plano.

A tese na OMS é de que o mundo apenas estará seguro quando todos estiverem seguros. Portanto, ter um dos países com a maior população do mundo sem uma política coerente representaria um risco regional e mesmo internacional. Ainda nas primeiras semanas da pandemia, a direção da agência lançou alertas ao governo brasileiro e respondeu às críticas que recebeu.

Mas a OMS optou por mudar de tom. Oficialmente, a ordem é a de não entrar em confronto aberto e público com o Brasil. Em abril, o governo chegou a enviar cartas ao diretor-geral da entidade, Tedros Ghebreyesus, insistindo sobre o que tem sido feito no país.

A tentativa de se evitar uma crise declarada, porém, não significa aplausos para o governo brasileiro. Na ONU, a crise brasileira também é alvo de comentários. Na semana passada, a alta comissária da ONU para Direitos Humanos, Michelle Bachelet, afirmou que a situação no país “preocupa”. Relatores das Nações Unidas também endereçaram uma declaração conjunta contra o governo brasileiro, criticando a gestão da crise.

Já a entidade Médicos Sem Fronteira afirmou ter ficado “indignada” pela forma que as autoridades estão lidando com a crise. Numa das revistas médicas mais influentes do mundo, The Lancet, o editorial há poucos dias citava a ameaça que Bolsonaro representa para o combate à pandemia. Na imprensa estrangeira, a imagem negativa do país ganha força, associando a crise ao comportamento do presidente. Le Monde, The Guardian, DW e outras publicações não têm poupado Bolsonaro de críticas.

Também é alvo de ironia entre os diplomatas estrangeiros o fato de que, em meio às mortes, o chanceler Ernesto Araújo tem usado a crise para alertar sobre o risco do “vírus do comunismo”.

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